Estudo
com mais de 15 mil pessoas indica que é possível se proteger do transtorno
psiquiátrico aumentando a ingestão de vegetais e oleaginosas e reduzindo a de
carnes vermelhas. Redução do risco de ter a doença chega a 45%
Isabela de Oliveira - Correio Braziliense
Publicação: 18/09/2015 11:28 Atualização:
Instintivamente, bichos bem simples e
humanos sabem que a sobrevivência depende da alimentação. No caso dos últimos,
o sustento virou sabedoria a partir do momento em que pensadores das sociedades
antigas passaram a observar a influência do que era ingerido na forma como as
pessoas pensavam, sentiam e agiam. Com o avanço da ciência, a relação ficou
mais clara do que nunca. No fim dos anos de 1800, por exemplo, médicos
naturalistas como John Harvey Kellog, inventor do cereal matinal de flocos de
milho, já defendiam a alimentação natural e alertavam que o consumo de carne
favorecia o aparecimento de dores de cabeça e transtornos mentais. Uma pesquisa
espanhola adiciona evidências disso: publicada ontem na revista BMC Medicine,
ela mostra que uma dieta baseada em frutas, verduras, legumes e nozes, e pobre
em carnes vermelhas e processadas, mantém longe a depressão.
Almudena Sánchez Villegas, principal
autora do estudo com 15.093 pessoas, diz que as propriedades anti-inflamatórias
e antioxidantes das frutas, verduras, legumes e nozes são as responsáveis pelos
efeitos protetivos.“Elas melhoram a capacidade do metabolismo da glicose e da
função endotelial. O endotélio é responsável pela síntese de neurotrofinas, um
tipo de proteína relacionado com a neurotransmissão e o bom funcionamento do
sistema nervoso central”, explica a professora do Departamento de Ciências
Clínicas da Universidade de Las Palmas de Gran Canaria, na Espanha.
Esses alimentos também melhoram a
fluidez e a permeabilidade das membranas celulares, onde ficam receptores de
neurotransmissores, como a serotonina. Além disso, alguns micronutrientes —
vitaminas do complexo B, folato, minerais e oligoelementos, por exemplo, o
zinco e o magnésio — têm papel essencial em processos neurofisiológicos. “Por
outro lado, as carnes processadas e o fast food são fontes de ácidos graxos
trans com propriedades inflamatórias que têm sido associadas ao risco de
depressão”, completa a pesquisadora espanhola.
Sem radicalizar
Os participantes do estudo faziam
parte do projeto SUN (Seguimiento Universidad de Navarra), que acompanhou
durante 10 anos graduados e profissionais registrados em províncias espanholas
para identificar padrões alimentares e de estilo de vida que favorecessem o
aparecimento de diabetes, obesidade e depressão. Nenhum deles apresentava o
transtorno mental no início do estudo, em dezembro de 1999. Oito anos depois,
1.550 pessoas haviam sido diagnosticadas com a doença.
Basicamente, essas pessoas aderiam,
em diferentes níveis, a três padrões de dieta comparados por Almudena Villegas:
mediterrânea, pró-vegetariana e o índice de alimentação saudável 2010 (Ahei
2010) (veja arte). Muitos dos participantes com padrão alimentar mais saudável
tinham diabetes, doença cardiovascular ou dislipidemia (nível elevado de
gordura no sangue), o que pode significar que eles só adotaram a dieta após o
diagnóstico das doenças. “Porém, não podemos afirmar isso com certeza”, pondera
a pesquisadora.
A maior redução nos casos de
depressão foi notada entre participantes com boa adesão ao Ahei 2010. Grande
parte do efeito protetivo dessa dieta, observa Villegas, deve-se à semelhança
com a mediterrânea. “Na verdade, nós tentamos explicar esse efeito após
eliminar a possível semelhança. Quando isso ocorreu, a proteção diminuiu.
Assim, nutrientes comuns e itens alimentares, como ácidos graxos ômega-3,
legumes, frutas, legumes, nozes e consumo moderado de álcool presentes em ambos
os padrões podem ser responsáveis pela redução do risco”, diz a principal
autora.
Como o Ahei 010 é menos restritivo, a
pesquisadora concluiu que, para se beneficiar, não é preciso abrir mão
completamente de guloseimas e carnes. “Não vimos nenhum benefício extra em
participantes rigorosos demais com uma alimentação saudável”, diz Villegas. A
redução do risco para a depressão foi de até 30% em pessoas que seguiam
moderadamente a dieta mediterrânea e de até 45% para adeptos ponderados do Ahei
2010. O padrão é compatível com a hipótese de que deficiências na ingestão de
alguns nutrientes podem representar um fator de risco para o transtorno
psiquiátrico. Uma vez que a quantidade recomendada é atingida, tanto as pessoas
de hábitos alimentares mais rigorosos, quanto as moderadas terão os mesmos
efeitos protetivos.
Mais influências
Outra possível explicação está
relacionada com as características psicológicas dos participantes
demasiadamente preocupados com a alimentação. “É possível que alguns indivíduos
fossem obsessivos ou neuróticos quanto à dieta e/ou à atividade física. Devido
a essas características, é possível que fossem mais propensos a desenvolver um
transtorno depressivo. Mas isso é especulação”, completa a autora.
Independentemente da causa, a nutricionista Jamila Vital Barbosa reforça que,
quanto mais variada a dieta, melhor é a saúde mental.
http://www.diariodepernambuco.com.br/app/noticia/ciencia-e-saude/2015/09/18
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